quinta-feira, dezembro 17

O Natal não é mais o mesmo...

Natal


Quando eu era criança, ele demorava muito tempo pra chegar. Aquela eternidade me fazia sonhar com o cheiro do pinheiro, o brilho das coloridas bolas de vidro, as luzes piscando, o papel celofane cortado em finas tiras, jogado aleatoriamente na árvore, que proporcionava um efeito mágico a tudo aquilo...

O ano se arrastava. Os dias eram longos demais. Pouco ou nada de TV, brinquedos que não precisavam de pilhas e muita, muita imaginação. Eu e minha irmã inventávamos mundos fantásticos, brincadeiras divertidas ou pequenas travessuras. Inspirado num desenho do Tom & Jerry, quase acidento meu pai ao pedir que ele se sentasse na cadeira, sem olhar que eu estava com um garfo preparado para espetar sua bunda. É, os desenhos desta época não tinham escrúpulos, e eu não sou um problemático por causa disso.

No primeiro fim de semana de dezembro ajudávamos minha mãe com a árvore. O presépio ela fazia questão de montar. As únicas peças que colocávamos eram os reis magos, que ficavam bem longe da manjedoura. A cada dia, antes de dormir, dávamos um passo com eles. Até o Natal, chegavam na gruta onde nascia Jesus.

Dia 24 passávamos na casa da minha avó. Perto da meia-noite ouvíamos um sino - que descobrimos depois partir de um disco de efeitos especiais que meu pai acionava na vitrola - e corríamos pra rua procurar o trenó do papai Noel lá no céu. Ao voltar pra sala, a árvore estava repleta de presentes. Isso era mágico. Depois de abrir os pacotes, comer e comer. E brincar. E ouvir o cinco-quatro-três-dois-um bons dias depois. E começar mais um ano que se arrastava bem devagar.

Bem diferente do que acontece com as crianças hoje, entrei na escola com 5 anos. Para um moleque desta idade, que acha que já viveu uma eternidade apenas brincando, era uma brusca mudança. Aquela entrada fria, portões de ferro, uma sala com muitas crianças - de onde que elas vieram? Em meu mundo anterior existiam pouquíssimas além de minha irmã - e outra pessoa para mandar em mim. Aquilo era novo, mas ainda demorava uma eternidade para a chegada do Natal.

Daí era tudo igual: a árvore, o presépio, os reis magos andando lentamente, dia a dia. Aquele mês para mim nunca terminava. Mas vamos vivendo, descobrindo coisas que nos traumatizam, pessoas tão próximas que não existem, mais lição de casa, lição até nas férias, acordar mais cedo pra novas etapas na escola, muitos professores ao mesmo tempo, mais lição, menos tempo, mais aulas, mais etapas, mudanças, mais responsabilidades, muito estudo, cursinho, faculdade, trabalho e, quando menos esperamos, surge o Natal numa propaganda ou num enfeite de rua. Nossa, como passou rápido. Parece que foi ontem o último. O tempo não se arrasta mais como antes: ele voa. E com esse vôo desaparace aquilo que mais nos encantava quando crianças: a mágica. Sem mágica perde a graça do mundo. A realidade é chata, feia e boba.

Mas é a realidade que existe, infelizmente. Sonhamos hoje com coisas materiais. Tenho saudades de ter nenhum conhecimento sobre como as coisas realmente funcionam. O mundo era algo sempre novo e misterioso, e era lento. Bem lento. Hoje, um ano passa tão rápido que se equivale a uns quatro meses da minha infância. Tudo corre contra o tempo. Pra adiantar o Natal, enfeitam as lojas no fim de outubro, mas mesmo assim tudo passa rápido, morno, sem sentimento.

É... o Natal não é mais o mesmo. Mas ainda é o Natal. É só parar pra sentir um pouco essa mágica, que ela reaparece. É fácil, até. Chegue perto de um pinheiro e feche os olhos: esfregue suas folhas e sinta aquele cheiro envolvente. Tente voltar no tempo: lembre como você era quando criança, no que pensava, como agia, o que representava o Natal pra você. Num milésimo de segundo, você se sente menor, sua fala modula palavras erradas, a árvore à sua frente fica gigante, e todas aquelas luzinhas se transformam num velhinho simpático que te dá um abraço apertado, revelando baixinho no seu ouvido que ele existe, sim, mas prefere ficar em seu canto pra manter viva esta misteriosa dúvida...

O Natal pode não ser mais o mesmo, mas ainda é o Natal. E se realmente quisermos, podemos fazer este milésimo mágico de segundo se arrastar, dia a dia, no nosso árduo ano a ano.

Feliz Natal e um ótimo 2010 a todos os meus leitores!


Agradeço ao Tiburcio pela bela ilustração de abertura deste texto.


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10 Quimeras:

@ dezembro 17, 2009 4:30 PM, Blogger Vitor disse...

Apesar de sempre querer saber de tudo, a ignorância sempre foi uma virtude, meu amigo...

me fez pensar bastante.

 
@ dezembro 17, 2009 7:33 PM, Blogger J.F. de Souza disse...

Grande Lasake! Gostei!

Me faz lembrar meus natais. Um tanto diferentes disso que você comenta... Mas tinham sua magia também.

E dá saudade.

 
@ dezembro 17, 2009 7:33 PM, Blogger J.F. de Souza disse...

Feliz Navidad pra você tbm, meu caro!

1[]!

 
@ dezembro 20, 2009 1:10 AM, Blogger Tai disse...

"Só as crianças sabem o que procuram, disse o principezinho." (Antoine de Saint-Exupéry)

Olá caro amigo!
Nossa, eu estava com saudades!
E nem lhe vejo mais online no msn...
Olha, voltei a blogar!
Até agora só estou (re)começando...!

=*

 
@ dezembro 20, 2009 12:41 PM, Blogger Yara Souza disse...

Todo mundo se vê nestas imagens...

Passar por aqui: um bom presente neste quase natal.

 
@ dezembro 21, 2009 2:15 PM, Blogger J.F. de Souza disse...

Ah! A ilustra ficou beeeeeeeeem bacana tbm! Tua caricatura ficou legal! =P

1[]!

 
@ dezembro 30, 2009 12:05 PM, Blogger Felisant disse...

Achei o Quimera.
feliz 2010.
ja te sigo no Twitter
Abraçs.

 
@ janeiro 05, 2010 10:02 AM, Blogger Ninha disse...

Na minha infância as coisas tb eram diferentes...nesse ultimo natal me senti uma idiota perguntando para as crianças o que elas ganharão do papai noeel...e elas respondiam q os pais q tinham comprado...qdo tiver filhos...vou tentar fazer q eles acreditem na magia do natal...

 
@ janeiro 08, 2010 9:51 AM, Blogger ella disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
@ janeiro 08, 2010 9:52 AM, Blogger ella disse...

Acho que minha infância não está tão longe assim para provocar saudade (pouco mais de uma década). Duvido que um dia me sentirei saudosa pois quando eu cheguei ao mundo, o tempo corria e dali a mais um pouco, voava.
Gosto do que você escreve.
Mesmo sabendo que não irei impressionar, me visite quando puder.
Até mais,
Daniella.

 

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